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Escrita rima com pressa?

André Soltau . Outono 2020 ( Escrito antes da quarentena)



Não tenho tempo para responder agora.

O filho está na escola, preciso buscá-lo a tempo. O banco fecha em 15 minutos. Tenho que passar no mercado e comprar ingredientes para o jantar. E se sobrar uns minutos quero ver aquela exposição que abriu semana passada e fecha hoje lá na casa de cultura. O dia começou cedo com correria de reuniões e compromissos. E aquele texto que prometi para o jornal? Hiiii, esqueci. Ah, tenho que fechar o texto do capítulo seguinte para enviar à edição. Vai ter que esperar a semana que vem.

Sabia que um texto não começa quando um escritor senta diante da tela vazia e escolhe a primeira palavra? Ele já observou a vida, fez anotações, escutou uma música calmamente, assistiu um filme e teve uma boa conversa na fila do mercado com aquela senhora de fala regional. Os primeiros esboços começam bem antes da primeira palavra estar ali na tela branca. O meu tempo de escrita pode ser dividido em dois momentos: No primeiro eu tomo notas, leio, vejo filmes, pesquiso, ouço pessoas, caminho pela cidade, passeio, ouço muitas coisas que vão de música à conversas em fila de mercado. Escrevo várias coisas ao mesmo tempo: um poema, um começo de crônica ou a ideia de um novo conto. Anoto detalhes da roupa e cabelos daquele estranho senhor que encontrei na rua ou tento descrever um cheiro que senti ao passar pelo mercado público que mistura peixes e xixi. (Quem escreve nunca passa por aí sem estar com seus cinco - eu falei cinco - sentidos abertos). Esse momento é bem longo, na verdade e está repleto de novas ideias, velhas ideias revisitadas e algumas desistências que podem ser provisórias também. O segundo momento é bem mais curto. Quando eu sento diante da tela branca e digito o que está composto em meus pensamentos e sentidos. Junto pedaços do que sinto por ai e escrevo por muitas horas ( só deixar que vou sem nem olhar o relógio teimando em me avisar em tictactic). Sou outro nesse momento e esqueço até das tarefas rotineiras.

Quer ver alguns exemplos de clássicos:

James Joyce levou 17 anos escrevendo no Finnegans wake, Já Dostoiévski, escreveu Crime e castigo no espaço de um ano, e O Jogador em menos de um mês.  Alguém arrisca em dizer se um é melhor ou pior livro?

Talvez Joyce tenha perdido o original e reencontrou uma década depois ao limpar seu sótão. Ou Dostoiévski precisava de grana para pagar dívidas de jogos e “apressou” seu texto mesmo que tenha construído a ideia por uma década. Mas só talvez. Talvez.

Outras curiosidades sobre livros que viraram filmes: O livro Laranja Mecânica de Anthony Burgess foi escrito em três semanas; o livro !984 de George Orwell foi escrito em um ano; e por fim, Game of Thrones, de George R. R. Martin levou cinco anos para ser finalizado

Mas a maior lição é que vai do tempo de cada um.

Escrita rima com pressa?


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