André Soltau . Outono 2020
Sim, foi.
Conto a vocês.
Foi bem assim.
Depois de uma profunda depressão, encontrei um lugar. A arte trouxe o pulso novamente e cá estou, escrevendo, publicando e ouvindo vozes de uma pequena cidade que promove encontros temperados pelas cores das suas ruas. Absorvo o jeito peculiar de um lugar à margem de um rio. Sou curioso com seus relatos sobre a vida às margens d’água.
Escrevi desde pequeno e nunca encarei a escrita como profissão. Não sei bem dizer o porquê, mas fui tomado por compromisso financeiros, boletos a vencer e uma quantidade enorme de tarefas que, ingenuamente achava eu, eram o fluxo da vida. Adoeci. O corpo pediu socorro. Um sinal vermelho acendeu nessa trajetória de carreira, currículo inflado, compromissos e bens materiais. A mente ficava fervendo de textos que esqueci pelo caminho.
Costumo carregar alguns cadernos de anotações – sem pauta, para que o texto siga seu rumo sem o aperto das linhas – cheios de poemas, começo de crônicas, ideias para contos, descrições de personagens que encontro pelas ruas e rabiscos que surgem em dias de folga das palavras.
Um dia qualquer achei uma caixa deles perdidos entre papéis velhos. Textos de anos que me fizeram rir, relembrar e, principalmente, descobrir que eu escrevi desde sempre.
Claro, claro que não foi só esse acontecimento. Com as redes sociais fui reencontrando amigos de infância e adolescência que me faziam uma pergunta, no mínimo, intrigante: “Você ainda escreve?” Bingo. Só eu não sabia!
E a vida? Ahhh a vida e suas bonitas surpresas. Por décadas fui professor e, não é que fui demitido “por contenção de despesas, blábláblá”. Feliz, assumi que da palavra iria viver.
Renasci palavra quando fiz do meu dia instantes de serenidade.
O peito ficou leve. Os pensamentos brincaram no papel e corrompi meu nome quando reconheci que um papel vazio é um território inesgotável para criar meu próprio universo.
Sorrindo, levo as horas escrevendo sem o tic tac teimoso do tempo teimando comigo.
Estou escritor agora.
