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  • Foto do escritorAndré Soltau

Escrever é um ato solitário, mas não leva à solidão

Atualizado: 23 de mar. de 2020

André Soltau . Outono 2020



A criação é um ato abstrato. Na escrita, posso dizer que é profundamente subjetiva e é erroneamente tratada como consequência de uma inspiração. Mas afinal, como acontece o ato de escrever?


O que move quem escreve a buscar as palavras para falar de seus sentidos sobre o mundo?


Será que as palavras dão conta de falar sobre a subjetividade de quem as usa?


Não tenho todas as respostas, claro. Mas desconfio que a escrita é um bonito modo de ficar em silêncio. Nesse instante que escrevo esse texto, meu silêncio é atravessado pelas palavras. Preciso silenciar o pensamento sobre o entorno para ser claro no que escrevo. Meu silêncio é habitado por uma infinidade de palavras que fracassam ou ganham o papel branco.


Sempre há um fantasma espreitando esses silêncios. Afinal o que seria a vida do escritor se a dúvida constante não estivesse ali espiando de soslaio? Muitos e muitos instantes de escrita deixam uma enorme distância entre o que desejo falar e o que escrevo. Meus fracassos são maiores do que conquistas.


Não, não mesmo. Pensa você que desce do céu uma ideia e a inspiração e talento fazem o resto? Nesse instante eu escrevo e coloco o feijão para cozinhar. No mesmo instante em que escolho palavras meus pensamentos estão em tarefas diárias ou cansaços e resquícios de uma vida em movimento. Escrever provoca suores e não a tão propalada iluminação que chega do além. Tolice isso.


Mas voltemos à pergunta inicial: como acontece o ato de escrever?


Mesmo que eu me ocupe da rotina de casa, o silêncio é relevante. Meu silêncio é a fuga que acho para ocupar a mente com uma ideia, um foco. É o meu momento nômade que desloca minha rotina para outros sentidos. As palavras surgem do silêncio.


Parece estranho se considerarmos que temos outro texto nesse blog que fala da música como inspiração. Silêncio com música? O texto escrito chega ao possível leitor para que ele use de sua intuição para entender o que está escrito e o que não está. É uma obra sempre aberta. Daí a importância de entendermos que o silêncio do escritor não é, necessariamente, o mesmo silêncio do leitor.


Acabei de dizer que o feijão está no fogo, a máquina lava panos de prato e eu escrevo no meu silêncio esse texto que você lê.


Essa relação - autor / leitor / texto - parte do princípio de que quando o autor escreve algo ele já torna o leitor um cúmplice do que está ali. Seu silêncio encontrará o leitor em seu silêncio.


Escrevi esse texto para dizer a você que a pergunta inicial não tem uma única resposta. A escrita é um ato solitário, mas não produz solidão afinal o leitor já está ali. O texto já carrega sua inconstância pois nunca fica parado, move-se com a leitura.


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